As histórias de Cristiana Guerra e do apaixonado Pequeno Príncipe só nos levam a concluir um óbvio que sempre nos deixa sem chão: o amor não sabe dizer adeus. Ou somos nós que não sabemos deixar o amor partir? Uma coisa é certa: o amor não vai embora. Ele fica tatuado em nossas vidas. Mesmo quando entra no limbo dos amores resolvidos ou mal-resolvidos, vamos levar conosco a história daquele amor vivido ou mal-vivido, dependendo da situação pela qual cada um passou.
Cristiana, em seu livro “Para Francisco”, fala de um amor ao mesmo tempo vivido e não vivido. Conheceu Guilherme, um colega de trabalho, pelo qual se apaixonou e foi correspondida. Guilherme trazia consigo marcas de um amor mal-resolvido. Tinha medo de se entregar, de se apaixonar de novo. Mas o amor não tem medo. Ele nos leva tanto a precipícios como a lugares tranquilos porque, definitivamente, não mandamos no coração.
Cristiana, por seu lado, viu em Guilherme o “beijo bom de bom dia”. Quem não gostaria de receber email todos os dias com mensagens assim? Guilherme fazia isso. E fazia traído por um amor enorme que sentia por Cristiana, um amor que o ligara a ela sem que ele nem percebesse. Não chegaram a se casar. Guilherme relutava e preferia ser casado em casas separadas.
Mas o amor, como eu dizia, nos prega peças. Foi ficando grande demais e precisava, ao invés de duas casas, de um lugar só, uma casa só, um pequeno lugar aconchegante com a grandeza de um lar. E foi o que fizeram. Compraram apartamento. Mas a morte, inimiga dos que amam, chegou antes. Levou Guilherme subitamente antes de ele e Cristiana viverem uma outra fase da vida a dois: o cotidiano.
Guilherme foi, mas deixou Francisco. Semente do amor, promessa de vida nova e certeza de que a vida continua. Cristiana precisava de tudo isso e, graças a tudo isso, ela se manteve viva, ela se levantou todos os dias para receber o “beijo bom de bom dia” de Guilherme, desta vez em outro plano. Tem uma vida intensa. Tem Francisco e, de certa forma, Guilherme. O amor que não foi embora.
No caso do nosso apaixonado Pequeno Príncipe, o amor dele por uma mulher casada foi embora e ficou ao mesmo tempo. Foi embora como um sonho, que nasceu naquele vagão de trem, em maio de 1943, no trecho entre Oran e Argel. E ficou justamente naquele vagão, junto com um príncipe apaixonado e infeliz.
Mas, convenhamos, ela, a mulher especial, não poderia nunca ter correspondido aos sentimentos do jovem apaixonado. Era casada. Tinha um marido, mesmo que não fosse seu amor verdadeiro. Ou era um amor de verdade e ela ainda não sabia? Ou era um amor menor? Aquele amor que se ama com menos força, mas se gosta desse amor. Afinal, o ser humano também se acomoda.
O fato é que o Pequeno Príncipe perdeu a ingenuidade ao conhecer o sofrimento do amor não-correspondido. Tornou-se crítico da situação: “Vale a pena todo esse sofrimento por quem nem mesmo pensa em avisar?” E, em seguida, ele chega à fatídica conclusão: “Certamente não”. Após enxergar que tudo não passou de uma aventura, o Pequeno Príncipe sangra. O ferimento no dedo ao tocar no espinho da rosa que colhera num momento de ventura é uma espécie de metáfora da decepção de um coração que sofre ao perder o seu amor. Restaram apenas o amor dentro dele e aquelas cartas jamais respondidas.
A mágoa maior não foi nem o amor impossível, mas o amor ignorado. Um amor que não teve nem a dignidade de ser informado que acabou, ou que ia começar. Nada. A falta de resposta completa e a completa indiferença. “Fiquei magoado por ter-me deixado esperando, não por não ter vindo”, reclamava o nobre, com o coração em frangalhos por um amor que se foi, mas que não foi embora.