sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Ele escrevia a neblina dos dias!

A Mário de Andrade ausente

Anunciaram que você morreu.
Meus olhos, meus ouvidos testemunharam:
A alma profunda, não.
Por isso não sinto agora a sua falta.
Sei bem que ela virá
(Pela força persuasiva do tempo).
Virá súbito um dia,
Inadvertida para os demais.
Por exemplo assim:
À mesa conversarão de uma coisa e outra.
Uma palavra lançada à toa
Baterá na franja dos lutos de sangue.
Alguém perguntará em que estou pensando,
Sorrirei sem dizer que em você
Profundamente.
Mas agora não sinto a sua falta.
(É semrpe assim quando o ausente
Partiu sem se despedir:
Você não se despediu.)
Você não morreu: ausentou-se.
Direi: Faz tempo que ele não escreve.
Irei a São Paulo: você não virá ao meu hotel.
Imaginarei: Está na chacrinha de São Roque.
Saberei que não, você ausentou-se. Para outra vida?
A vida é uma só. A sua continua
Na vida que você viveu.
Por isso não sinto agora a sua falta.
(Manuel Bandeira)

Foi através desse poema que eu conheci Bandeira e passei a admirá-lo.
Não me dou muito bem com a poesia. Não que eu não goste. Não é isso. Mas eu não sei respirar e isso dificulta a leitura de qualquer texto, especialmente, de poemas porque devem ser lidos em voz alta, pois a sonoridade (a rima) faz parte e é bem relevante na obra.
Lançado o "desafio" dessa leitura, oportunizou-se mais uma chance de conhecer suas obras. Respirei fundo e lá fui eu!
Em o livro A cinza das horas, o autor reuniu poemas sobre horas cinzas de sua infância, de seus amigos, de sua poesia, de seus dias. E daí refletiu-se a cor no livro, nos poemas, nas palavras. Entretanto, o cinza não destrói o colorido da beleza da obra.
A respiração continua ruim, mas na inspiração fez toda diferença.

P.S.:
"Foi por esse amor
Teu corpo é tudo que brilha
É a única ilha no oceano
Do meu desejo

Foi por esse amor
Tão bela flor de laranjeira
Teu corpo é tudo o que cheira"
(Chiclete com Banana)

A semelhança será mera coincidência?rs.